Saboreando ainda nossos estudos de História Eclesiástica no
querido Instituto Salesiano Pio XI, de São Paulo, escrevi sobre Lutero quatro artigos,
publicados em nossa GAZETA DE ALAGOAS, em minha coluna semanal das
sextas-feiras, em 21/01, 28/01, 04/02 e 11/02. Esses artigos foram provocados
pelo filme, de evidente conotação publicitária, patrocinado que foi – ao menos
em sua exibição aqui no Brasil – pela organização DIACONIA, a versão luterana
da católica ADVENIAT. Para o nosso SEMEADOR, quero resumir num único artigo o
que interessaria dizer sobre o fundador do Protestantismo.
Vou
comentar as observações que o Prof. J.
L. Delgado fez sobre o filme num seu artigo, publicado no Jornal do Commercio
do Recife em 30 de janeiro. Ele chama de três lições, que seriam as seguintes:
1ª - a marcha da insensatez, como ele classifica a situação moral grave da Igreja no tempo de
Lutero; 2ª - a escalada das radicalizações entre Alemanha e Roma; e por fim, a
3ª, o mistério da Igreja, que ele diz que, sendo divina, sobrevive a todas as
calamidades de sua atribulada história.e vence todos os percalços, erros e
escândalos.
A propósito
da lª observação, lembro que por dois séculos, ouviu-se na Igreja o brado:
“Reforma na Cabeça e nos membros!” Os três papas do período anterior a Lutero
foram Alexandre VI (1492-1503), que
deixou péssima fama quanto à sua moralidade, ao menos antes do papado, como militar com 4 filhos, apesar de ter iniciado as missões no Novo
Mundo e, como espanhol, ter realizado, num solene exercício do Supremo
Pontificado, a famosa divisão das terras a descobrir na América entre Espanha e Portugal, muito
favorável à Espanha, depois reformada
pelo Tratado de Tordesilhas (1494); Júlio II (1503-1513), grande
guerreiro, conquistador de cidades e pouco pontífice, ainda considerado um bom
papa; e Leão X (1513-1521) um Médici, filho de Lourenço, o Magnífico, de
Florença, que até tinha boas intenções, mas pensava equivocadamente que seu
apoio às artes e a construção daquela que ele denominava “a Catedral da
Cristandade”, a Igreja de São Pedro no Vaticano, resolveriam os graves
problemas morais e disciplinares da Igreja. Em 1510, quando Lutero esteve em
Roma ainda se falava muito – e mal – de Alexandre VI, e o monge agostiniano se
escandalizou com as indulgências, o culto das relíquias e o proceder da Cúria
romana.
Na 2ª lição
de J. L. Delgado, eu acrescentaria a
divulgação do famoso documento intitulado “Gravamina nationis germanicae” (Os
agravos, desgostos, da nação germânica), que eram as queixas da Alemanha contra
a Igreja de Roma. Juntou-se a esse fato a rivalidade entre as duas mais
importantes Ordens religiosas da época: agostinianos e dominicanos. Seus
mestres, entre os quais Lutero, brilhavam nas cátedras de teologia. “Havia
frades demais” - diz com sarcasmo um historiador da época. Daí resultou o
famoso comentário em Roma, diante das primeiras notícias da crise na Alemanha,
“isso não passa de uma querela de frades...” Foi assim que veio a idéia, algo
irônica, de reunir o Concílio que daria a autêntica reforma da Igreja, em
Trento, “in faucibus Germaniae” - nas fauces (ou goela) da Alemanha... O
Concílio, hoje ignorado por muitos, proclamou com firmeza os dogmas católicos e,
com intrepidez, realizou a suspirada reforma moral, esperada há séculos...
Belíssimo
o comentário final que o ilustre professor e articulista tece, na que ele chama
3ª lição, da inexpugnabilidade da Igreja de Cristo, não obstante a reconhecida
fraqueza histórica de alguns de seus líderes. Continua de pé a palavra de
Jesus: “As portas de Hades (a potência da Morte e da destruição) não
prevalecerão sobre minha Igreja” (V. Mt 16, 18) e: “Eu estarei convosco todos
os dias até o fim dos tempos” (Mt 28,20) Todos os dias. Os bons e os maus.
A
complexa personalidade de Lutero (1483- 1546) foi definida por um historiador
sério e isento: extraordinária força de imaginação – veemente paixão em seus
empreendimentos – ternura de afetos – linguagem virulenta – sensibilidade
poética e musical – arroubos místicos e ódio implacável ao papado e a Roma –
sugestionabilidade e teimosia – exaltações e depressões – pavor doentio do
diabo e da condenação eterna, de que se julgava merecedor, como confessou à
esposa, a ex-freira Catarina de
Bora.
Esse
foi o Lutero – monge, teólogo, pretenso reformador da Igreja e agitador social.
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