quinta-feira, 10 de abril de 2014

SÃO JOSÉ DE ANCHIETA

“Quanto à língua, eu estou nela um tanto adiante, ainda que é muito pouco para o que  soubera, se me não ocupara em ensinar gramática. Todavia tenho toda a maneira dela por arte” – escrevia Padre Anchieta aos seus irmãos jesuítas de Coimbra em 1555.  No ano seguinte, o Pe. Manoel da Nóbrega voltava para a Bahia  e já levava consigo A Arte da Gramática da Língua mais usada na Costa do Brasil, escrita por Anchieta,  e  impressa em Coimbra em 1595. Foi ele o primeiro missionário do Brasil a falar a língua dos nativos. Já o Pe. Nóbrega, vindo para o Brasil em 1549, achava que a língua dos indígenas  era incapaz de exprimir os conceitos necessários para a evangelização. Escrevia para a Europa: “São eles tão brutos que têm mui poucos vocábulos para lhes poder bem declarar nossa fé.”  
                Anchieta nasceu no dia 19 de março de 1534, dia de S. José – daí seu nome - em Laguna, nas ilhas Canárias, possessão espanhola. Quando estudava filosofia em Coimbra, entrou na Companhia de Jesus, sendo aparentado com o fundador dos jesuítas, Inácio de Loiola. Veio para o Brasil, ainda seminarista, em 1553. Ensinou latim na escola de Piratininga, fundada por ele e Pe. Nóbrega no dia 25 de janeiro de 1554, festa da conversão de São Paulo, data considerada como a da fundação da cidade de S. Paulo.
Com o mesmo Nóbrega, ficou refém em Iperoig  para conseguir a pacificação entre índios  e  portugueses. Conta-se que, prisioneiro dos índios, enquanto Nóbrega voltava a Piratininga para negociar com os portugueses, ao cair da noite,  os caciques levaram suas filhas para que escolhesse  alguma para dormir com ele. Foi nesta ocasião que escreveu em latim, nas areias da praia, em agradecimento a N. Senhora, seu “Poema à Virgem”, que ele memorizava cada dia, para passá-lo depois para o papel em São Vicente.
                Foi ordenado sacerdote na Bahia em l566. Foi provincial das casas da Companhia de Jesus em São Vicente, S. Paulo e Espírito Santo. Deixou vários escritos em língua tupi, português, castelhano e latim. Na província do Espírito Santo, fundou a vila de Iriritiba (hoje, Anchieta)  onde morreu aos 63 anos, em 9 de junho de 1507.
               O processo de canonização começou em 1617 e só em 22 de junho de 1980, o Papa João Paulo II o declarou bem-aventurado. Finalmente, o Papa jesuíta Francisco fez a chamada  canonização equivalente, por um decreto, assinado no dia 3 de abril deste ano, em audiência privada com o Cardeal Amato, que lhe apresentou formalmente o processo de canonização para receber a aprovação papal. No próximo 24 de abril, na igreja chamada do  Gesú  em Roma, dedicada a S. Inácio de Loiola, o Papa Francisco celebrará solene liturgia de ação de graças  pela canonização do Apóstolo do Brasil, para a qual já estão convidados todos os bispos brasileiros.
                Concluo com esses versos de seu maravilhoso Poema à Virgem:
                “Que o Espírito de amor com seu fogo celeste / caldeou e, pura assim, toda ouro te fizeste! / Cresceu-me a reta fé desde a mais tenra idade, / por dádiva do Filho e maternal bondade!”


terça-feira, 8 de abril de 2014

A ALEGRIA DO EVANGELHO

“Fica abolida a lei do celibato também para os padres do Ocidente” – “As mulheres  podem ser ordenadas sacerdotisas” – “O aborto é permitido”  ??? - Os jornalistas  chamados “vaticanistas”, que sabem as coisas do Vaticano fora dos muros, terão ficado decepcionados com  a Exortação Apostólica pós-sinodal, a primeira do Papa Francisco, “Evangelii Gaudium”( A Alegria do Evangelho) sobre a evangelização hoje, comentando os pontos discutidos pelos Bispos no último Sínodo, de 2012, sobre a nova evangelização. Nada das inovações estrondosas, com que iniciei este artigo e  que alguns pretendiam e chegaram a anunciar, que o Papa Francisco iria fazer...
“A alegria do Evangelho enche o coração e a vida inteira daqueles que se encontram com Jesus. Quantos se deixam salvar por Ele são libertados do pecado, da tristeza, do vazio. Quero convidá-los para uma nova  etapa evangelizadora, marcada por esta alegria e indicar caminhos para o percurso da Igreja nos próximos anos.  Os males do nosso mundo – e os da Igreja – não deveriam servir como desculpa para reduzir a nossa entrega e o nosso ardor” – inicia o bispo de Roma seu primeiro documento pastoral, após a Encíclica sobre a Luz da Fé, feita em conjunto com Bento XVI.
“Precisamos – continua o Papa Francisco – recuperar o frescor original do Evangelho com novas formas e métodos criativos. Desejo dirigir-me aos fiéis cristãos para convidá-los a uma nova etapa de evangelização, marcada por esta alegria, num estado permanente de  missão, vencendo o grande risco do mundo atual, que é o cair numa tristeza individualista”. “Sinal do acolhimento de Deus – continua a Exortação -  é ter por todo lado igrejas com as portas abertas, para que aqueles que estão à procura não encontrem a frieza de uma porta fechada. A Eucaristia não é um prêmio para os perfeitos, mas um generoso remédio e alimento para os fracos. Somos chamados a agir neste campo com prudência e audácia.”
Longo trecho, dos números 135 a 162, o Santo Padre dedica à homilia e à leitura espiritual, de grande interesse para todos os sacerdotes e ministros da Palavra. Sobre a catequese (nºs 163-168), o Papa quer evidenciar que ela tem como papel fundamental o primeiro anúncio, o querigma, e deve ocupar o centro da atividade evangelizadora e toda tentativa de renovação eclesial. Com força e audácia o Papa fala de uma reforma das estruturas eclesiais para que se tornem mais missionárias. E ele pensa também numa reforma do papado para que ele seja mais fiel ao significado que Jesus Cristo lhe quis dar (n. 32).
A inclusão social dos pobres, ensina o pontífice, deriva de nossa fé em Cristo que  se fez pobre e sempre se aproximou dos pobres e marginalizados. Curiosamente, o Papa cita um documento dos Bispos do Brasil, que é um reflexo do Concílio: “Desejamos   assumir a cada dia as alegrias e esperanças, as angústias e tristezas do povo brasileiro, especialmente as populações das periferias urbanas e das zonas rurais.” “Para a Igreja, diz Francisco, a opção pelos pobres é mais uma categoria teológica que cultural, sociológica, política ou filosófica.”
O bispo de Roma nos exorta a recuperar o frescor original do Evangelho com novas formas e métodos criativos. Precisamos, diz ele, de uma conversão missionária e pastoral e não podemos deixar as coisas como estão.                    

             Concluo com essa expressão vigorosa do Papa Francisco: “A Igreja proclama o evangelho da paz e está aberta à colaboração com todas as autoridades nacionais e internacionais para cidar desse bem universal tão grande

sexta-feira, 4 de abril de 2014

NOVO REITOR MOR DOS SALESIANOS

No Capítulo Geral dos Salesianos, reunião mundial  da  Congregação, que se realiza em Roma, cada seis anos, o Padre Pascual Chavez,  presidente da Assembleia e até aquele momento, Reitor Mor dos Salesianos, chamou à mesa  o Pe. Angel Fernandez Artime e disse-lhe: “Caríssimo Padre Angel, Deus, através dos irmãos capitulares, chamou-o hoje a ser o Sucessor de Dom Bosco. Está, portanto, chamado, não a conformar-se com o atual Reitor, nem com os seus predecessores, mas a ser o Sucessor de Dom Bosco. Portanto, em nome da Assembleia Capitular, na forma canônica, pergunto-lhe se aceita.”  - “Hoje sim é que eu preciso falar em espanhol,” brincou comovido o Pe. Angel. E acrescentou: “Abandono-me a Deus, e peçamos a Dom Bosco e a Maria Auxiliadora que nos acompanhem e me acompanhem, na fraternidade dos Salesianos e com a Congregação.” E concluiu com emoção: ”COM FÉ, ACEITO.”
                Eram 10,20min da terça-feira, dia 25 de março, e tinha-se concluído o primeiro escrutínio para a eleição do Reitor Mor.
                O  Padre Angel nasceu em 1960 em Luanco-Gozon, nas Astúrias (Espanha).  Com 18 anos, fez seus primeiros votos religiosos e em 1984 sua profissão perpétua. Foi ordenado sacerdote com 26 anos. É laureado em teologia pastoral e licenciado em filosofia e pedagogia  De 2000 a 2006 foi provincial (que os Salesianos chamam de Inspetor) de Lion, na Espanha.  Em 2009, foi nomeado Superior da Inspetoria da Argentina, onde teve a oportunidade de colaborar com o arcebispo de Buenos Aires, Cardeal Jorge Bergoglio, hoje Papa Francisco. Havia sido nomeado, em dezembro último, superior da nova Inspetoria da Espanha mediterrânea, cargo que não poderá mais assumir porque, como décimo Sucessor de Dom Bosco, deverá agora desempenhar o ministério de Pai para toda a Família Salesiana.
              O novo Conselho Geral dos Salesianos apresenta notável variedade de nacionalidades. O Ecônomo Geral, responsável pelas finanças da Congregação, é o irmão leigo, Sr. Jean Paul Muller, nascido em Luxemburgo. O Conselheiro para as missões é americano, de Washington; outro Conselheiro é mexicano; outro é de Gozo, do arquipélago de Malta. Um é indiano e nem estava em Roma no Capítulo Geral e sim em Jerusalém. e aceitou o cargo por telefone. O Conselheiro para a Europa Centro-Norte é o polonês Pe. Rozmus, atual diretor em Perúgia na Itália central.
                 Assim, a Família Salesiana em seus trinta grupos, esparsa em todo o mundo, conta hoje com líderes, provenientes das mais variadas nações, unidos todos com o ideal de Dom Bosco: “Daí-me almas, levai o resto!”


Fraternodade e tráfico humano

Nesta Quaresma, os bispos do Brasil convocam mais uma vez os cristãos católicos a  estudarem e refletirem tema de pungente realidade: o tráfico humano. Neste nosso mundo de ambição e sensualidade, o tráfico de pessoas humanas ao redor do planeta assume proporções inauditas.  Explorar o trabalhador incauto, aproveitar o desejo de ascensão social a  
qualquer custo de jovens despreparadas, unido à ingenuidade, tem sido regra comum para ambiciosos de lucro fácil e aproveitadores da ignorância de tantos.
                O Papa Francisco, em 28 de fevereiro último, com forte expressão, falou da desumanização da sociedade contemporânea. No ano passado, ele havia orado pelos náufragos de Lampedusa, emigrantes africanos que buscavam a Itália, fugindo da miséria e escravidão, e pedira providências às autoridades italianas.
O Manual da CNBB da Campanha da Fraternidade deste ano apresenta exemplos aterrorizadores. Alguns deles: 
- Tráfico para exploração no trabalho. Homens aliciados para trabalhos forçados em condições de quase escravidão, na construção das hidrelétricas ou na agricultura. Conheci  em Alagoas uma cidade, cujo vigário me dizia que sua população estava sendo reduzida a velhos, mulheres e crianças, porque os homens válidos estavam indo trabalhar nas usinas de açúcar de Minas Gerais. Eu mesmo presenciei nessa cidade, em visita pastoral, o embarque em três ônibus de mais de uma centena de trabalhadores para usinas mineiras.
                - Tráfico para exploração sexual. Mocinhas pobres e ingênuas são levadas, iludidas, notadamente para a Espanha, para prostituição. Lá, têm o passaporte retido e nunca conseguem pagar uma dívida falaciosa, oriunda da passagem aérea e da manutenção em bordéis.
                - Tráfico para extração de órgãos. Este crime nefando consiste na  venda e exportação de órgãos de doadores voluntários ou enganados, para realizar cirurgias. O caso mais conhecido foi apurado no início de ste século, com vítimas que vendiam um rim no Recife e eram levados para Durban, na África do Sul, onde se submetiam a cirurgias para extração do  órgão. Em 2004 – informa a CNBB – o Ministério  Público Federal denunciou 28 pessoas por esse crime. A estimativa é que o esquema criminoso tenha movimentado em torno de US$ 4,5 milhões, comercializando cerca de 30 órgãos.     
                - Tráfico de crianças  e adolescentes. São duas modalidades igualmente criminosas: para adoção ou para trabalhar. Na década de 80, informa a CNBB, quase 20 mil crianças foram enviadas ao exterior para adoção. E é grande o contingente de crianças trabalhadoras: são 866 mil crianças, de 7 a 14 anos, alistadas como trabalhadoras no Brasil.

                Diante desse quadro de exploração humana, nossa consciência cristã exige o mais  veemente repúdio e ações coercitivas, que estiverem ao nosso alcance, nem que seja ao menos a denúncia  corajosa.

MEDO DE MORRER

Certa vez aconteceu em Maceió que um adolescente, diante do corpo de seu pai, um político misteriosamente assassinado, disse à mãe: “Antes da vida, nada! Depois da vida, nada! Então, para que a vida?” É a visão materialista da vida,  sem a luz cristã.
                Temos medo de morrer, é verdade.  Mas...   e os santos?
Domingos Sávio, santo aluno de Dom Bosco, morreu dizendo: “Oh! Que bela coisa estou vendo!” O fato foi declarado por seu pai, sob juramento, no processo de canonização.
São Cirilo, eslavo, cuja festa celebramos neste mês e que, com seu irmão Metódio, criou o alfabeto chamado cirílico, e traduziu os textos litúrgicos para a língua eslava, antecipando assim de onze séculos o Concílio Vaticano II, morreu em Roma em 14 de fevereiro de 869. Na hora da morte, cantava: “Meu espírito alegrou-se quando me disseram: Vamos à casa do Senhor!” Erguendo as mãos para o alto, orava com lágrimas. “E assim, narra sua biografia eslava, adormeceu no Senhor, com 42 anos de idade.” 
Santa Teresinha de Lisieux, a jovem carmelita, falecida aos 30 de setembro de 1897, com 24 anos, muito querida do povo brasileiro, ao Padre Capelão que lhe perguntara se estava resignada a morrer, respondeu: “Ah, meu Padre, parece-me que precisaria mais de resignação para viver; quanto a morrer, é para mim uma inefável consolação.”  É o eco da expressão paulina:  Cupio dissolvi et esse cum Christo – “ Desejo morrer para estar com Cristo.”                                                                                               A  Superiora, que era a Madre Inês de Jesus , sua irmã Paulina, fez um  apêndice na “História de  uma alma”,  - maravilhosa autobiografia, que enriqueceu a hagiografia cristã - relatando os últimos momentos, vividos nesta terra pela santinha de Lisieux. Relata a Madre Inês que as últimas palavras de Teresinha foram: “Oh!...Amo-o!  Meu  Deus, eu vos amo!”  Inclinou a cabeça para a direita e nessa posição ficou alguns minutos. Depois reergueu-se de improviso, abriu os olhos e ficou bastante tempo fitando o alto, até fechá-los definitivamente.  Sua face guardou inefável sorriso, que lhe animava o semblante,  atesta a Madre Superiora.
                O que ocorre não é medo de morrer, é falta de fé no que nos espera depois dessa vida.
O que nos inquieta é para o que nos abre a porta da morte.

 Com fé, digamos com o salmista: “Minha alma tem sede de Deus e deseja o Deus vivo. Quando terei a alegria de ver a face de Deus?” (Salmo 41).